Para começar, quero esclarecer um conceito bastante difundido, mas errado: “pagar aluguel é jogar dinheiro fora”. Mesmo que o imóvel seja próprio, o custo de oportunidade do capital nele empregado (os rendimentos que seriam ganhos caso o dinheiro investido no imóvel estivesse em aplicações financeiras) pode ser considerado como o “aluguel pago a si mesmo”. Assim, de qualquer forma se “paga aluguel” e o ditado popular inicial, portanto, não faz sentido.
Isso posto, não existe uma única resposta certa para a questão, mas o importante é que todos os fatores envolvidos sejam levados em conta e que a discussão seja feita preferencialmente por toda a família, dado que a decisão afetará a vida de forma importante por um longo período de tempo.
A melhor abordagem para esse tema não começa pelas questões financeiras, embora elas sejam muito importantes, mas sim por outras, de diferentes ordens, verdadeiramente fundamentais.
Recomendo que se levem em consideração, nessa análise, três aspectos fundamentais, para só então verificarmos os números:
- Perfil – Se a família tem um perfil mais conservador, tendo como um de seus valores mais fortes a segurança, para quem a satisfação de “morar no que é seu” e a liberdade para uma eventual reforma ou outra alteração no imóvel sejam importantes, então a tendência é que a opção pela compra seja a mais adequada, dado que estará alinhada com seu perfil e com um importante valor. Para famílias nas quais esse não é um valor relevante e que o importante é a posse e não a propriedade, o aluguel faz mais sentido.
- Fase de vida – Falamos aqui da flexibilidade requerida, dado o tamanho das incertezas futuras. Se a fase da vida for de indefinições sobre potenciais grandes mudanças, a flexibilidade que o aluguel fornece é uma característica desejada. Cito como exemplo um jovem casal de noivos, para os quais há a perspectiva de casamento e do nascimento de filhos em breve, mas pode acontecer de que esses planos não se realizem da maneira planejada. Ou então jovens profissionais que tenham empregos em empresas com sedes em diversas cidades e que podem ser transferidos ou mesmo que possam trocar de emprego para outra localidade exigindo, assim, mais flexibilidade. Já para um casal de meia idade, cujos filhos já formados saíram de casa para seguir com suas vidas, a estabilidade da situação e, por conseguinte, a pouca necessidade de flexibilidade tenderão a lhes indicar a compra como a melhor opção.
- Disciplina – Para uma família que tem dificuldades para acumular e manter patrimônio, há uma tendência de que os gastos do dia a dia tomem toda a renda e que não haja poupança (ou que ela seja muito pequena, proporcionalmente à renda) visando a criação de um patrimônio para o futuro. Quando não há poupança, normalmente acabam-se resgatando-se valores de aplicações de tempos em tempos, para algum imprevisto ou mesmo para aquele sonho de consumo. Para famílias com essas características, a compra do imóvel é bastante indicada, já que, de outra forma, o capital seria perdido no consumo. De outro lado, para aquelas famílias com disciplina para a poupança, o aluguel pode ser mais interessante, pois pode proporcionar oportunidades de obtenção de rentabilidades maiores de seu capital durante o período de acumulação.
Somente após essa análise, verificando-se as tendências decorrentes desses três fatores, é que se deve pensar nos aspectos financeiros. Então, vamos a eles.
Compra à vista ou o aluguel:
A média dos valores de aluguéis em São Paulo gira em torno de 0,3% a 0,35% do valor do imóvel ao mês, e normalmente são reajustados pelo IGP-M.
Assim, do ponto de vista financeiro, seria vantajoso alugar o imóvel, em vez de comprá-lo, se tivéssemos uma rentabilidade para o nosso capital superior a esse 0,3% / 0,35% ao mês acima da inflação. Isso é possível?
Possível? Sim. Provável? Talvez.
A faixa com a qual trabalhamos para cenários futuros de rentabilidades reais (acima da inflação) na maioria dos casos varia entre 0,2% e 0,4% ao mês, no longo prazo, dependendo de diversos fatores e lembrando que os retornos maiores poderão ser alcançados com os investidores assumindo riscos maiores, notadamente com maior parcela em investimentos de renda variável e que isso deverá estar de acordo com o perfil do cliente e, portanto, não para todos.
Assim, se pensarmos entre comprar um imóvel para moradia, cujo custo de oportunidade estará entre 0,2% e 0,4% ao mês, ou alugarmos um imóvel, cujo custo fica em torno de 0,3% / 0,35% ao mês, vemos bastante equilíbrio e esse aspecto, portanto, não é decisivo.
Outros fatores podem ainda influenciar, como:
- Possível valorização do imóvel acima da inflação (bastante rara no longo prazo), que conta pontos para a compra do bem;
- Alguma oportunidade de investimentos em negócios próprios por parte de determinada família, que precisará da liquidez dos recursos, que conta pontos para o aluguel;
- Riscos inerentes ao mercado financeiro, que podem fazer com que os investidores saquem seus recursos em momentos de baixa, realizando perdas permanentes de capital, que conta pontos para a compra;
- Risco de manutenções estruturais de grande monta no imóvel, que conta pontos para o aluguel;
- Maior liquidez do capital em aplicações financeiras do que no imóvel, provendo segurança em momentos de infortúnios, que conta pontos a favor do aluguel.
Como vemos, a decisão entre a compra (não financiada) ou o aluguel, do ponto de vista financeiro, apresenta um “empate técnico”, devendo a decisão ser baseada nas análises dos três fatores fundamentais e nesses cinco outros aspectos.
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Compra financiada ou o aluguel:
Para termos da forma mais objetiva possível a resposta sobre essa questão, vamos fazer um exemplo numérico, com as seguintes premissas:
- Alugar o imóvel e poupar outro valor para posterior compra à vista do bem, ou
- Comprar o mesmo imóvel por meio de financiamento;
Além disso, as condições são as seguintes;
- O custo efetivo total (CET, englobando juros, impostos e outras taxas) de um financiamento imobiliário gira em torno de 10% ao ano;
- O aluguel fica por volta de 0,35% ao mês sobre o valor do imóvel;
- O valor do imóvel (em nosso exemplo, R$ 750 mil) acompanhará a inflação do período, não tendo nem valorização nem desvalorização real;
- Há custos de transferência do imóvel – ITBI, escritura e custos cartorais – de 7% do valor;
- Existem R$ 350 mil de recursos disponíveis e o financiamento será por 30 anos.
Vamos ver como ficam os cálculos:
A família que optou por comprar o imóvel deu R$ 297.500 de entrada e pagou R$ 52.500 para as custas de transferência, totalizando um desembolso de R$ 350 mil.
A partir daí se iniciarão as prestações mensais e consecutivas pelos próximos 360 meses, de R$ 3.828, pela tabela Price.
Já a família que preferiu o aluguel não teve nenhum desembolso inicial e pagará o valor de 0,35%, ou seja, R$ 2.625.
Para que possamos comparar escolhas, temos que admitir que uma mesma família poderia ter optado por uma ou por outra, e, sendo assim, caso a família tenha optado pelo aluguel, assumiremos que ela dispunha dos R$ 350 mil que, a partir desse momento, ficam aplicados a uma taxa de 0,35% ao mês acima da inflação.
Da mesma forma, como a família poderia pagar a prestação de R$ 3.828, mas pagará apenas o aluguel de R$ 2.626, a diferença (R$ 1.202) será poupada mensalmente, na mesma aplicação em que estão os R$ 350 mil iniciais.
Com esses parâmetros, a família que optou por pagar o aluguel terá os R$ 802.500 (R$ 750 mil do imóvel mais os 7% dos custos) necessários para a compra do imóvel (atualizado pela inflação) no prazo de 144 meses, ou seja, em 12 anos, enquanto que a família que optou pelo financiamento só terminará os pagamentos em 30 anos.
Esses resultados tornam mais do que evidente a vantagem financeira do aluguel sobre o financiamento. Assim, recomendo fortemente que se reflita de maneira muito serena e longa antes de se firmar um compromisso pelos próximos 10, 20 ou 30 anos, já que as consequências serão muito grandes em caso de uma escolha equivocada.
Resumindo:
- Se sua família tem os recursos para aquisição do imóvel à vista, a escolha é menos relacionada à parte financeira e outros fatores são mais determinantes;
- Se a sua família não tem os recursos, nem um perfil disciplinado e poupador, a compra financiada (ou por meio de consórcio) pode ser sua única opção para a construção de patrimônio. No entanto, se a sua família conseguir se manter disciplinada, as recompensas financeiras deverão ser enormes.
Boas escolhas!