Com a Selic baixa, consultores recomendam diversificação e mais risco para quem quer retornos maiores, veja algumas opções para compor o portfólio
A Selic baixou para 4,25% ao ano e a recomendação dos consultores não mudou: quem quiser mais retorno, vai ter que topar correr mais risco. Nesse cenário, o que tem começado a interessar investidores mais ousados são investimentos “alternativos”, que não são tão usuais no mercado financeiro, como empréstimos entre pessoas (os chamados “peer-to-peer lending”) e o financiamento de projetos no início de operação, o “equity crowdfunding”.
Assim como outros ativos tradicionais do mercado financeiro – ações, CDBs (Certificado de Depósito Bancário) e debêntures -, essas novas opções partem do mesmo princípio: virar sócio ou emprestar dinheiro a alguém, pessoa física ou jurídica, que dê um retorno maior do que se tem hoje com a magra renda fixa tradicional. O que muda é o grau de risco de calote (crédito) que você corre. Lembre-se: a era do alto retorno com baixo risco acabou (RIP Selic a 14% ao ano).
Riscos
“Quanto maior o retorno, maior o risco. Opções como ‘P2P lending e equity crowdfunding’ são muito arriscadas e não possuem nenhuma garantia de retorno. O investidor se torna uma espécie de anjo em um projeto, que pode ser bem sucedido ou não. Por isso, é preciso entender os riscos de um produto de muita volatilidade”, diz Flávio Byron, sócio da Guelt Investimentos.
Ele recomenda que seja investido um percentual de, no máximo, 2% do seu patrimônio neste tipo de produto financeiro. “E o investidor precisa estar preparado para a possibilidade de perder toda a quantia”, diz, o que pode acontecer num possível calote das empresas nesse tipo de dívida (caso do P2P lending) ou participação acionária mais moderna (o equity crowdfunding).
O planejar financeiro Valter Police, que comanda a área educacional da Fiduc, alerta para riscos ocultos, que nem todo investidor percebe e cita como exemplo pessoas que investiram tudo no mercado imobiliário e a construtora faliu, levando toda a poupança.
“Normalmente são vendidos com garantia de rentabilidade, ao menos por algum tempo. O cliente não presta atenção no verdadeiro risco, que é muito pior. Caso se concretizem, trazem grandes problemas”, diz Police.
O ‘risco bom’, segundo ele, que é o da oscilação diária, como nos investimentos mais tradicionais (renda variável e renda fixa) são, infelizmente, os que causam mais medo nos investidores justamente porque o risco é escancarado todo dia.
Conheça algumas dessas opções e exemplos de plataformas por onde você pode investir:
1.P2P Lending
O empréstimo entre pessoas é algo relativamente novo no Brasil – o modelo foi regulado pelo Banco Central em 2018. O empréstimo pode ser feito para pessoas físicas ou jurídicas. O processo varia de plataforma para plataforma, mas, em geral, quem empresta escolhe o os investimentos. As devoluções dos recursos ao credor são mensais e os retornos variam entre 14% a 65% ao ano, mas o risco de inadimplência é alto. Antes de aplicar em um desses marketplaces, cheque se ele tem o certificado de SEP (Sociedade de Empréstimo entre Pessoas).
Alguns exemplos de plataformas P2P lending:
Peak Invest: permite que pessoas físicas ou investidores institucionais emprestem dinheiro para empresas que precisam de crédito com taxas mais atrativas. Após passar por uma análise, o tomador ganha uma nota de risco (rating), que definirá a taxa de juros cobrada naquele contrato. O valor mínimo de pedido de empréstimo é de R$25 mil. Para o investidor, é possível emprestar a partir de R$ 1 mil. Retorno entre 16% e 45% ao ano.
Nexxos: a fintech foi a primeira a fazer um empréstimo entre pessoas e tem como foco financiar empresas. Segundo informações do site, o retorno varia entre 16% e 45% ao ano e o investidor também recebe parte do montante emprestado acrescido de juros todo mês. Permite que o investidor escolha o nível de risco que quer correr (que está relacionado à taxa de juros esperada).
Firgun e Sitawi: a proposta de ambas as plataformas de empréstimo coletivo é ajudar pequenas empresas (ou microempreendedores) a conseguirem dinheiro para tirar ideias e projetos do papel, um lado mais social. Ambos funcionam por temporadas de captação e os mínimos investidos são de R$ 25 (no caso da Firgun) e R$ 1 mil (na Sitawi).
Pela Sitawi, a remuneração depende do projeto, mas, em média, é oferecido um juro de 12% ao ano em cima do principal, pago em 24 parcelas mensais, sendo que há carência de quatro meses para começar a pagar o principal (neste período o investidor recebe apenas os juros). Em março, a plataforma abrirá nova rodada, desta vez os negócios que vão captar são todos negócios da floresta, que atuam na Amazônia, com impacto socioambiental positivo.
No caso da Firgun, o juro depende do valor que o projeto captou. Até R$ 3 mil, o investidor não recebe retorno acima do principal (a ideia é dar um suporte social); de R$ 3 mil a R$ 9 mil terão rendimentos de 6% ao ano; e de R$ 9 mil a R$ 15 mil, os rendimentos previstos são de 12% ao ano.
A responsabilidade em caso de calote é de quem emprestou.
2. Crowdfunding
As vaquinhas virtuais ficaram famosas por ajudar a financiar ideias, projetos e eventos. E já tem algum tempo que elas começaram a serem vistas também como uma forma de financiar empresas, em geral startups que estejam em fase inicial do projeto, ou ainda empreendimentos imobiliários. O chamado equity crowdfunding foi regulado em 2017 pela Comissão de valores Mobiliários (CVM) e captou em 2018 R$ 46 milhões. A expectativa é que ultrapasse R$ 78 milhões em 2019 (os dados oficiais só saem em abril).
A ideia é simples: juntar dinheiro de vários investidores interessados em emprestar para esses projetos em troca de uma participação (ação da empresa). O risco é da empresa não vingar e você perder todo o dinheiro aplicado. Além disso, pode demorar anos até que você veja o retorno, já que a remuneração só acontece quando há a “saída” do investidor, como a venda da participação para outro investidor maior.
Mas, se o negócio for bem-sucedido, o retorno pode ser bem maior do que a Selic. Em julho do ano passado, a plataforma de investimento coletivos Kria concluiu a venda de um dos negócios financiados por seu site – a plataforma de venda de imóveis retomados Resale, para o banco BTG Pactual. Com isso, teve gente que viu o dinheiro render 128% em menos de três anos. Essa foi a primeira vez que pessoas que colocaram seu dinheiro em um projeto de equity crowdfunding viram lucro.
As próprias plataformas fazem a seleção dos projetos que ficam disponíveis em seus sites. Também é quem ajuda a definir o valor mínimo e a quantidade de ações dada em troca. O valor dos investimentos varia de plataforma para plataforma, mas em geral a aplicação mínima varia entre R$ 500 e R$ 1 mil.
Por lei, investidores que tenham renda bruta anual ou investimentos financeiros menores que R$ 100 mil, só podem aplicar até R$ 10 mil por ano neste tipo de investimento. Para os que tenham até 1 milhão, o limite é de R$ 100 mil; acima disso, não há restrições.
Enquanto no crowdfunding habitual recebe-se ações da empresa, no crowdfunding imobiliário os investidores vão receber uma parte do Valor Geral de Vendas (VGV) daquele empreendimento. Neste segmento imobiliário, vale perguntar se a plataforma opera sob jurisdição também do Banco Central do Brasil – uma segurança a mais.
Conheça algumas plataformas do tipo:
Eqseed: uma das maiores plataformas, já captou R$ 30 milhões investidos em 24 startups por meio da plataforma. Seis empresas já captaram investimento após suas primeiras rodadas na EqSeed, captando valores maiores e aumentando seu valor de mercado em suas “ações” (ainda não teve nenhuma “saída”) entre 67% e 275% em um prazo de 1 a 3 anos. O valor mínimo varia conforme o projeto.
Kria: Até agora empresas captaram 30 milhões via a plataforma. É uma das que permite investimentos de valor pequeno, como R$ 500. Os tipos de projetos ofertados são de diversos setores e não só empresas de tecnologia.
StartMeUp: a plataforma é mista, oferece projetos imobiliários, de saúde, bebidas e tecnologia, para citar alguns exemplos.
Urbe.me: focada em empreendimentos imobiliários. Segundo informações do site, as ofertas começam a partir de R$ 1 mil, mas há projetos com mínimo maior. O retorno vem depois que o imóvel estiver pronto e as unidades forem vendidas.
3. Títulos bancários
Dentro do mercado de títulos bancários, há alguns produtos menos usuais na carteira dos investidores, como os RDBs (Recibo de Depósito Bancário), os “CDBs de financeiras” e LCs (Letras de Câmbio), títulos de crédito. Ambos contam com a proteção do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Os valores mínimos que devem ser investidos variam de acordo com a instituição financeira.
A plataforma Poupa Brasil se especializou neste tipo de renda fixa e atua como um marketplace que vende a partir de R$ 10 mil iniciais RDBs e LCs. São investimentos mais difíceis de sacar (a maioria só permite no vencimento do título), mas costumam oferecer rendimentos maiores que outras opções de renda fixa. Como qualquer outro investimento do gênero, RDBs e LCs oferecem ao investidor o pagamento do principal acrescido de juros prefixados, sem oscilações negativas. O rendimento varia entre 0,3% e 128% do CDI, dependendo da instituição emissora do título e do prazo do papel.
4.Venture capital
Com a Selic a 4,25%, investir em startup começa a entrar como alternativa de diversificação no portfólio dos mais ricos. Muitos “familly offices” (escritórios que cuidam do dinheiros de famílias abastadas) já alocaram uma fatia pequena de seu dinheiro em fundos de investimento que são focados em investir em diversas empresas de tecnologia. Agora, começam a surgir alternativas para pessoa física, como o Fundo multimercado do Itaú com a Redpoint eventures, o Itau Redpoint Eventures 2 Mult FIC Multimercado.
Mas, vale lembrar que é um fundo de longo prazo – no regulamento dele, ele tem duração de 12 anos (até 2031) e não haverá resgate antes disso (a menos que você encontre algum comprador para a cota. Investimento em startups, em geral, demoram um tempo até a maturação e até fazer a ‘saída’, prazo que no Brasil varia de cinco a dez anos. Esse fundo do Itaú, por exemplo, rendeu em 2019 abaixo do CDI.
Uma alternativa para quem tem mais dinheiro é procurar fundos de capital semente, que investem em empresas em estágio inicial, como Canary, Inseed e Bossa Nova.
Outra opção é usar a plataforma da 100 Open Startups para encontrar negócios. A plataforma tem como objetivo juntar empreendedores com potenciais investidores, fornecedores ou consultores de negócios.
Por Naiara Bertão, Valor Investe — São Paulo