Em tempos de coronavírus e instabilidade no mercado, o brasileiro deve voltar a investir no Tesouro Direto? É certo que a festa da renda fixa parece ter chegado ao fim por aqui. Se antes as pessoas garantiam altas rentabilidades ano após ano quase sem nenhum risco, hoje a situação é diferente. Sucessivas quedas na taxa básica de juros brasileira (Selic) – o índice foi de 14,25% a 3,75% em menos de quatro anos –, fizeram com o que papéis do Tesouro Direto mudassem de patamar.
Embora a queda acentuada na taxa básica de juros tenha assustado quem antes tinha bons ganhos com a renda fixa, a mudança de patamar da Selic foi essencial para dar mais dinamismo para a economia e mercado financeiro. O que acontecia anteriormente era uma distorção. Em muitos casos, os papéis de renda fixa conseguiam trazer retornos maiores do que os da renda variável, como ações e fundos – que possuem riscos mais elevados.
“Os ativos mais seguros do mercado tinham retornos enormes, até maiores que os de renda variável. Essa queda na taxa básica trouxe uma normalização ao mercado”, diz Diego Link, gerente do Tesouro Direto, ligado à Secretária do Tesouro Nacional (STN).
Selic cada vez menor
Ao que tudo indica, o patamar da taxa básica de juros baixa veio para ficar. Desde outubro de 2016, o governo anuncia cortes consecutivos na Selic, fazendo com que ela atingisse os atuais 3,75%. Agora, diante de uma recessão global iminente causada pela pandemia de coronavírus, a tendência é a de que a taxa básica continue em baixa.
O ponto é que com a Selic cada vez menor, a renda fixa deixou de ser atrativa para muitos investidores. E isso fica evidente ao se analisar os saldos de vendas. Em janeiro, houve mais um mês de saldo negativo: entraram R$ 2,046 bilhões e saíram R$ 3,005 bilhões.
É o terceiro mês seguido em que isso acontece. Em tempos áureos (dezembro de 2015), com a Selic a 14,25%, o saldo positivo chegou a ser de R$ 1,246 bilhões.
Vale a pena investir no Tesouro?
Em meio a todo esse contexto, a pergunta que fica é: ainda vale investir no Tesouro? Para Claudia Yoshinaga, coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Getúlio Vargas, essa modalidade ainda está bem longe de ser desinteressante para o investidor brasileiro.
“Historicamente o brasileiro ama renda fixa e vai continuar aplicando seu dinheiro ali”, diz ela. “A questão que fica é que o investidor precisa diversificar para não perder rentabilidade.”
Para analisar a questão, CNN Business ouviu alguns especialistas, listou produtos e trabalhou com simulações. Confira, a seguir, as melhores opções de investimento:
Tesouro Selic
É o título mais simples disponível e pós-fixado – aquele em que você não sabe qual será o rendimento final até o dia do resgate. Como o Tesouro Selic é atrelado à taxa básica de juros, é natural que esta modalidade renda pouco neste momento. Apesar disso, Valter Police Jr., diretor da planejadora financeira Fiduc, acredita que o título possui alguma serventia: substituir a famosa e ainda amada poupança.
“Serve para o dinheiro do dia a dia. Deve ser utilizado, por exemplo, para manter uma reserva de emergência, já que pode ser retirado quando necessário sem perda de rendimentos e tem nível de confiabilidade alta”, diz. O ideal é que este montante seja seis vezes o valor dos seus gastos mensais.
Exemplo: Se você investir R$ 100 reais no papel Tesouro Selic 2025 e fizer aportes mensais de R$ 30 (investimento total de R$ 1.870), terá um resultado estimado de R$ 2.116,05, quando retiradas as taxas, se esperar que o título vença.
Caso queira ou precise sacar o dinheiro antes, esse valor será menor. Simulação realizada no site do Tesouro Direto no dia 23 de março de 2020.
Tesouro IPCA+
Essa modalidade paga a variação da inflação no período do título, medida através do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), mais uma taxa de juros pré-estabelecida. Com a Selic em baixa, o papel pode se tornar uma boa opção à médio e longo prazo (há títulos que vencem em 2026, 2035 e até 2045).
“Com as sucessivas quedas na taxa de juros nos últimos anos, o IPCA+ vem rendendo bem até aqui. Se o movimento for o contrário, pode ser prejudicial. A rentabilidade é bem maior do que o Tesouro Selic, mas só vale investir se não precisar se desfazer do dinheiro antes do prazo”, explica Police.
Exemplo: Se você investir R$ 100 reais no papel Tesouro IPCA+ 2026 (IPCA + 4,10%) e fizer aportes mensais de R$ 30 (investimento total de R$ 2.380), terá um resultado estimado de R$ 2.949,30, quando retiradas as taxas, se esperar que o título vença. Simulação realizada no site do Tesouro Direto no dia 23 de março de 2020.
Tesouro Prefixado
Os títulos prefixados, como o próprio o nome diz, pagam exatamente os juros atrelados ao papel. Com isso, você sabe exatamente o que vai receber quando retirar o dinheiro. Mas, ao contrário do que parece, isso pode não ser exatamente uma vantagem para o investidor. Se a inflação subir muito durante o período, por exemplo, a rentabilidade pode ficar comprometida.
Isso porque a taxa de juros atrelada ao papel é fixada no momento da compra, não levando em conta a inflação futura do país. Então, se esse índice subir muito e ficar acima da rentabilidade do título, o dinheiro investido terá, na prática, se deteriorado e perdido poder de compra.
“Estes papeis são de longo prazo e vão vencer lá na frente: 2023, 2026, 2031 e assim vai. Nós não sabemos como estará o Brasil até lá. Por isso, é preciso ter cuidado ao comprar estes títulos, ainda mais em períodos de baixas históricas de juros”, afirma José Faria Júnior, planejador financeiro pela Planejar, Associação Brasileira de Planejadores Financeiros.
Exemplo: Se você investir R$ 100 reais no papel Tesouro Prefixado 2023 e fizer aportes mensais de R$ 30 (investimento total de R$ 1.090), terá um resultado estimado de R$ 1.182,86, quando retiradas as taxas, se esperar que o título vença. Simulação realizada no site do Tesouro Direto no dia 23 de março de 2020.
Juros Semestrais
IPCA+ e Tesouro Prefixado também possuem opções de títulos que pagam juros semestrais. Ou seja, o investidor recebe os dividendos do seu dinheiro investido a cada seis meses. “Esta modalidade pode ser boa, por exemplo, para complementar a renda de um aposentado, já que vai pagando aos poucos”, aponta o planejador José Faria Júnior.